quinta-feira, 14 de junho de 2012

Corte Moicano, da glória ao abismo.




Quem me vê nos dias de hoje espalhado por aí pode até me julgar mal. Não fui sempre assim sabe ? Minha história começa em meados do século 15, quando a tribo dos Moicanos em uma atitude de protesto se negava a deixar os homens brancos cortarem seus cabelos e para tanto arrancavam com as próprias mãos as laterais e cultivavam apenas a crista central do couro cabeludo. Eu era imponente. Enfeitava as cabeças de um dos povos mais temidos daquela época. Era símbolo de rebeldia e uma afronta contra a invasão forçada da cultura branca sobre os hábitos indígenas. Foi justamente por esse caráter revolucionário que fui mais uma vez lembrado no final dos anos 70, quando me escolheram como um dos maiores símbolos do movimento Punk. Alí foi meu auge. Eu estava estampado na juventude transgressora e nos palcos das maiores bandas de rock do mundo. Virei uma bandeira, uma seita, um símbolo. E assim foi por um longo período, até que começou a minha decadência.
Pouca gente sabe, mas minha primeira aparição no mundo pop veio de uma revista em quadrinhos. Ocorreu quando a Marvel Comics se sentiu no direito de me colocar na cabeça do personagem Daken, filho do Wolverine. Até aí tudo bem né ? Afinal de contas o pai do cara era durão, cheio de pose e fazia sucesso com as tais garras. Acho mesmo que quem decretou o meu fim foi o inglês David Beckham. 
Depois que o sujeitinho apareceu na Copa do Mundo de 2002 me estampando em sua madeixas loiras sedosas o mundo nunca mais me viu da mesma maneira. Eu passei de símbolo da anarquia para item da moda fashion. Daí em diante qualquer burguesinho descolado se sentia no direito de me aderir. 
Vale lembrar a contribuição da Cássia Eller que me colocou ao movimento lésbico no anos 90. Lembro bem do dia que senti que estava no fundo chegando ao fundo do posso. 
Foi quando de repente me vi na cabeça do Junior Lima cantando Imortal no programa da Eliana. Foi o fim. Eu não era mais um corte de cabelo, tinha me tornado um acessório metrossexual. Foi quando começaram a usar os cremes e gels no meu cabelo e me combinar com acessórios bastantes suspeitos. Não tinha mais amigos. Não tinha mais respeito. Os outros cortes zombavam de mim. E como não há desgraça nesse mundo que não possa piorar, depois de um tempo surgiu um tal magricela brasileiro com o nome esquisito que além de lançar a combinação da chapinha com o meu penteado, ainda teve a audácia de me descolorir com água oxigenada. 
Foi aí que acabou tudo. Hoje você pode me encontrar em qualquer lugar do mundo e das mais variadas formas. Liso, crespo, esticado, descolorido, tingido, caído, para cima, para o lado e de traz pra frente. Eu que vim do Rock hoje sou símbolo de dupla sertaneja pop banda Emo e grupo de pagode. Eu que comecei na cabeça de um astro da seleção inglesa, hoje tenho que agüentar o fato de qualquer borrabotas que consegue passar o pé sobre a bola sem cair e bater 3 embaixadinhas se achar no direito de me usar. Essa é minha história meus amigos. A história de como os meus anos de glória de transformaram nesse martírio dos dias atuais. 
Deixo aqui a minha súplica. Que voltem os topetes, rastafáris, dreads, skin heads, os espetados e as tranças. Que me deixem em paz para curtir minha fase final de vida antes que seja mais um corte de cabelo extinto por aí. E que, principalmente, todos saibam de onde surgi, o que representei e qual a minha história. Porque sabem amigos... eu já tive grandes momentos.  

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